O Jogo de guerra didático no ensino e no treinamento militar
Criado pelo Conselheiro do Exército prussiano, o Tenente Georg Leopold von Reiswitz, o Kriegspiele, jogo de guerra no idioma alemão, foi um sistema utilizado para a instrução e treinamento de manobras táticas para os oficiais daquela nação. Inicialmente denominado “Instruções para representação de manobras táticas”, o primeiro livro de regras foi criado em 1812.
O método de Reiswitz para simular a guerra baseou-se inicialmente em torno de uma mesa especialmente projetada para o Rei Friedrich Wilhelm III. A mesa foi dividida em quadrículas e foram confeccionados terrenos pré-moldados usados como um quebra-cabeças com uma grande variedade de combinações. Usou-se, ainda, peças de jogos especiais, dados e blocos para representação de tropas.
O livro de regras original estabeleceu inúmeras diretrizes utilizadas posteriormente em convenções cartográficas militares pelo mundo. Algumas permanecem até os dias atuais como codificações de cores das forças (azuis, vermelhas, amarelas), símbolos para acidentes no terreno, entre outras.
Várias adaptações foram realizadas ao longo do tempo. O jogo inicial contava com inúmeras regras sobre movimentação e engajamentos. Os embates eram longos e demoravam, por vezes, mais do que as ações de combate real. Nos anos seguintes foram surgindo adaptações até se obter a versão mais simplificada do sistema inicialmente complexo.
A ideia aliada ao surgimento da informática fez surgir, anos mais tarde, simuladores construtivos tais como o COMBATER, utilizado pelo Exército Brasileiro. Utilizando um sistema de computador a tropa é representada sobre uma carta topográfica onde são replicados os embates entre os contendores. Os comandos são emitidos para as Unidades por um operador do sistema. O software considera inúmeras variáveis como poder de combate, terreno e alcance das armas para definir o resultado dos engajamentos. Dessa forma, a simulação construtiva auxilia no adestramento dos Estados-Maiores, principalmente, no tocante ao processo de tomada de decisão.
Todavia, o sistema de Reiswitz trouxe oportunidades de aplicações diversas. O Centro de Instrução de Blindados vem, desde 2016, utilizando nos exercícios de simulação virtual tática, o terreno reduzido semelhante ao Kriegspiele. No terreno reduzido, montado em forma de maquete, são apresentados problemas militares simulados para os Comandantes de Subunidade e Pelotão das tropas Blindadas e Mecanizadas. O Comandante de Subunidade permanece, durante a simulação, isolado dos demais participantes tendo apenas o contato rádio com seus subordinados.
O exercício para subunidades no terreno reduzido é dividido em 5 fases: apresentação das regras, planejamento, emissão de ordem, execução e análise dos resultados.
Na primeira fase, destinada à explanação das regras, o instrutor abordará as peculiaridades da simulação no terreno reduzido. Aproveitando as observações históricas sobre a lentidão que a complexidade das primeiras versões do Kriegspiele trazia, os instrutores do CI Bld procuraram simplificar as manobras para evitar longos embates ineficazes. A representação das tropas, movimentação, engajamento e arbitragem foram facilitados para evitar que um rol extenso de regras interferisse na dinâmica da instrução e tornasse a atividade demorada. Nessa fase, também, o Comandante recebe uma ordem de operações em formato de decisão para retirar suas dúvidas e iniciar seu planejamento.
Após a primeira fase e já com as informações do problema militar em mãos, o Comandante de Subunidade inicia o planejamento da sua ação. Visando forçar a rapidez de raciocínio e a flexibilidade, o tempo disponibilizado nessa fase não deve ser extenso. Para a situação apresentada, são utilizados quarenta minutos até a emissão da ordem. De acordo com o adestramento da tropa esse tempo pode ser reduzido podendo chegar a até vinte minutos para um bom planejamento.
Na próxima fase o Comandante de Subunidade faz a emissão sumária do seu planejamento para os pelotões e apoios. A emissão da ordem, por diretriz fundamental, tem que ser precisa, rápida e completa, sendo transmitida, preferencialmente, via rádio.
A execução da operação é realizada na quarta fase. Nela, os comandantes de pelotão da arma base, de engenharia e o oficial de artilharia na função de observador avançado, de posse de um rádio, carta, esquema de manobra e material de anotação, sentam em um dos lados do terreno reduzido. O instrutor, representando a direção do exercício e o inimigo, permanece do outro lado. O Comandante de Subunidade fica isolado em uma sala com rádio e carta topográfica, sem observar a manobra.
Os participantes realizam suas ações um de cada vez. No terreno reduzido ficam posicionadas cartas fechadas com uma interrogação impressa. Ao realizar uma ação o participante pede para observar aquele incidente específico no terreno. A carta nesse momento é aberta e pode representar um elemento civil, amigo, inimigo ou neutro. No mesmo instante o reporte da informação é realizada para o Comandante da Subunidade que pode interferir na operação a qualquer momento. Outras ações podem ser desencadeadas como: movimentação de tropa, execução de fogos diretos, pedido de apoio de fogo indireto, correção de tiro, abertura de passagem, lançamento de fumígeno, entre outras. Ao final das ações da tropa azul o inimigo executa duas ações contra a força oponente. O final da operação se caracteriza pela conquista do objetivo ou a perda do poder de combate da força azul.
Na última fase é feita a explanação da manobra e análise do resultado da operação. Nesse momento o Comandante da Subunidade, tendo como base o que recebeu pelo rádio, aborda o que foi executado pela sua tropa, explorando seus erros e seus acertos. O instrutor faz sua intervenção ressaltando os aspectos da manutenção da consciência situacional para as operações.
Como meio didático o terreno reduzido apresenta um ganho substancial no aprendizado cognitivo de táticas, técnicas e procedimentos pois o instruendo consegue praticar as ações conforme as diferentes situações impostas pela direção do exercício.
O objetivo secundário do exercício no terreno reduzido conduzido no CI Bld é mostrar aos oficiais e sargentos do corpo de tropa a possibilidade de realizar uma simulação sem a necessidade de meios de tecnologia de alto custo. Instruções semelhantes podem ser conduzidas nas Unidades para cabos e soldados em complementação a palestras e com outras finalidades. Instruções de exploração rádio e técnicas de identificação de blindados podem ser desenvolvidas nesse modelo. Para tanto, basta que no planejamento da atividade o instrutor defina os objetivos a serem alcançados para utilização dessa ferramenta simples e eficaz de treinamento militar.
Victor Emanuel Neves Ferreira - Maj Cav
Adjunto da Seção de Simuladores do CI Bld
Carlos Alexandre Geovanini dos Santos - Ten Cel
Comandante do CI Bld