Não é de hoje que as atividades de simulação tem sua importância reconhecida pelo Exército Brasileiro, no sentido de otimizar o adestramento de suas frações. De fato, ainda em abril de 1916, por intermédio do Boletim do Exército nº 450, a instituição reconheceu a grande utilidade deste tipo de exercício e recomendava o desenvolvimento dos chamados “Jogos de Guerra”, não só nos Quartéis Generais, mas também nos Corpos de Tropa.
Nos últimos anos, contudo, é inegável que a simulação, em qualquer das suas modalidades (Construtiva, Virtual ou Viva), vem ganhando espaço e importância no Treinamento Militar. Especificamente, como parte integrante do Projeto Leopard 1, o Exército adquiriu diversos tipos de simuladores, que visam o treinamento dos integrantes das Guarnições de Carros de Combate (Gu CC) em diversos níveis.
Por se tratar de um moderno meio de combate, com alta tecnologia embarcada, o Leopard 1 A5 BR necessita ser tripulado por militares especializados e que conheçam a fundo o funcionamento e a operação dos seus sistemas. Desta forma, a capacitação destes recursos humanos não deve ser encarada como pontual e encerrada ao final dos cursos de formação, adaptações ou treinamentos específicos, senão como um processo cíclico, contínuo e progressivo, que se prolonga pelo tempo em que se mantém o contato com a operação do material.
Da mesma maneira, os meios de simulação não devem ser considerados apenas como ferramentas para a formação de recursos humanos habilitados a utilizar a Viatura Blindada de Combate (VBC), mas podem, e devem, ser utilizados para enriquecer outros processos e atividades.
Alinhado com este entendimento, através das suas Diretrizes de Blindados, o Comando Militar do Sul estabeleceu a execução de uma série de atividades a fim de garantir um padrão mínimo necessário para que uma fração seja considerada em condições de tripular a sua Viatura Blindada em Operações.
Não se deve, no entanto, considerar que este processo por si só representa os objetivos de treinamento que devem ser alcançados. Como já foi citado, ele representa apenas o padrão mínimo necessário à fração para que seu emprego operacional não represente riscos à segurança, sem tornar menos importante os objetivos de adestramento constantes nos Programas Padrão da série Alfa.
Ao tratarmos de treinamento militar, é importante que este seja reconhecido como um processo contínuo e de dificuldade gradativa, que visa, além do ganho de habilidades e competências profissionais, o desenvolvimento e aprimoramento da coesão da fração envolvida. Esse processo culmina na fase de adestramento, que, de acordo com o Sistema de Instrução Militar do Exército Brasileiro, “é o conjunto de atividades realizadas para desenvolver ou treinar capacidades individuais ou coletivas que contribuirão para que uma OM atinja a condição de participar de Operações Militares”. Portanto, é primordial que, no intuito de adestrar as Guarnições e Pelotões CC, vislumbre-se além dos objetivos impostos.
Uma vez que a Guarnição CC é a célula base que constitui, de forma indivisível, todas as frações de Carros de Combate, o treinamento neste nível é primordial para a obtenção de eficiência nos maiores escalões. Não devendo ser encarado, portanto, como etapa a ser acelerada na busca de maior ênfase aos demais níveis.
No caso das Gu CC, em função de suas peculiaridades, a coesão deve assumir um nível mais alto: a sinergia entre os membros do grupo. Nesse sentido, considerar a importância da continuidade e progressividade das atividades de treinamento é essencial. Em função do grande ganho no aproveitamento operacional das frações, aliado a um baixo custo de execução, a simulação deve receber a devida ênfase neste processo. Esta ênfase é facilitada, principalmente no nível Guarnição, em função dos meios de simulação estarem disponíveis nos RCC. A possibilidade da sua execução, de forma contínua, contudo, depende diretamente da priorização do treinamento militar sobre as demais atividades administrativas da OM.
Este treinamento deve ser bastante amplo, não se atendo somente às atividades realizadas por ocasião da formação dos membros da guarnição, mas buscar a inserção de graus progressivos de dificuldade e habilitar, assim, os recursos humanos à operação do Carro de Combate com eficiência mesmo em situações adversas e em condições não ideais.
Tampouco devem-se restringir estas atividades apenas à execução de cenários nos Treinadores Sintéticos Portáteis (TSP). Atividades nos Simuladores de Procedimentos de Motorista (SPM) e de Torre (SPT) também devem ser bastante exploradas. É comum que ambos os Simuladores de Procedimentos sejam exaustivamente utilizados na formação dos recursos humanos e, por vezes, negligenciados na continuidade do treinamento.
Por ser o único recurso a exigir o carregamento e troca de munição pelo Auxiliar do Atirador e por apresentar alto nível de fidelidade, no que diz respeito aos instrumentos e periféricos do meio real, o SPT tem uma série de possibilidades que devem ser exploradas. Dentre elas podemos considerar a reação da Guarnição a panes; comando de tiro; processo de transferência de alvos do Comandante de Carro (Cmt CC) para o Atirador (Atdr); avaliação de distâncias pelo Retículo OTAN e pelo gabarito de distâncias da luneta TRP; troca de munição pelo Auxiliar do Atirador (Aux Atdr), mediante sua seleção pelo Cmt CC; operação em modo degradado; e, Normas Gerais de Ação (NGA) da guarnição.
Os exercícios realizados no TSP reproduzem de forma fidedigna as dificuldades do processo de busca, detecção e engajamento de alvos. Isto se dá em virtude da utilização de um cenário virtual, onde o inimigo, dotado de inteligência artificial e obedecendo comandos emanados pelo instrutor, pode surgir e atirar contra a guarnição de forma inopinada. A fim de explorar ao máximo estas possibilidades, devemos evitar a repetição constante dos mesmos exercícios e buscar novos cenários dentro do rol de exercícios já existente nos simuladores, bem como criar novos cenários, aumentando assim o número de ferramentas de treinamento disponíveis.
Como dito anteriormente, o SPM, juntamente com o SPT, tendem a ser bastante subempregados na fase de treinamento. Especificamente para o SPM, este problema é facilmente resolvido pela inserção, além dos exercícios de reação a panes e transposição de obstáculos (bastante explorados na fase de formação do motorista), de atividades de treinamento de formações de combate e Técnicas de Ação Imediata (TAI) do Motorista (Mot).
A fim de garantir a progressividade do processo, as Seções de Instrução de Blindados (SI Bld) dos RCC devem buscar a evolução do treinamento, mantendo registro do desempenho de cada fração e, assim, selecionar exercícios de diferentes níveis de dificuldade para frações em diferentes níveis de proficiência. Assim, uma guarnição que trabalha junta há dois anos, executará exercícios diferentes de uma guarnição que foi composta no ano corrente. De forma que ambas as frações sejam incentivadas a evoluir através da execução de atividades desafiadoras.
Da mesma forma, quanto à continuidade do treinamento militar, vemos que, em função da natureza extremamente técnica da operação de meios blindados, a execução de atividades dispersivas ou não relacionadas à operação do meio, por parte de integrantes de Gu CC, impactam muito negativamente na manutenção dos padrões de desempenho e, consequentemente, na operacionalidade das frações que os enquadram. Desta maneira, deve-se buscar preservar estas frações, permitindo que as atividades de treinamento sejam efetivamente priorizadas. Igualmente, em função da importância da sinergia entre os membros da guarnição, a máxima preservação de sua integridade tática no passar dos anos deve ser buscada.
Sendo assim, pode-se verificar a extensão das ações a serem desenvolvidas e a sua extrema dependência à correta priorização de atividades. A operacionalidade da tropa blindada está intimamente ligada ao tempo disponibilizado para treinamento de todas as suas frações, e deve receber a devida importância. Um exército pode passar anos sem ser empregado, mas nenhum instante sem estar preparado.
AÇO, BOINA PRETA, BRASIL!
André Almeida do Nascimento – 1° Ten
Instrutor do CI Bld
Ádamo Luiz Colombo da Silveira – Cel
Comandante do Centro de Instrução de Blindados.